Um vírus dizimou mais de 90% dos habitantes do planeta. Um dos sobreviventes – um famoso cientista militar – procura desesperadamente a cura para a doença que levou ao extermínio quase toda a humanidade, e inclusive a morte de sua mulher e filha. Sozinho em Nova Yorque ele busca por outros sobreviventes da catástrofe. Meses se passam nesta busca. Anos. Até que um dia ele encontra um. Ana. Uma jovem esperançosa que afirma ter conhecimento de um campo de refugiados, não muito longe dali. O cientista não acredita. “Estão todos mortos”, argumenta. Ela não tem provas, não tem informações a respeito, mesmo assim sustenta, convicta, aquele pensamento com outra afirmação ainda mais enigmática: “Deus falou comigo”. Aquilo soa como tolice aos ouvidos do famoso cientista. Mesmo assim a moça insiste: “Você nunca escutou a voz Dele?”. E acrescenta: “É o silêncio...”.
Nunca se vira, talvez, em toda história da humanidade, um silêncio como aquele. Com o extermínio dos habitantes de Nova Yorque aquela cidade, pela primeira vez, ficou em silêncio absoluto. No silêncio o homem ouve coisas. No silêncio absoluto, longe da agitação, longe das infinitas vozes de pessoas, do barulho de carros e buzinas, longe de todos os estímulos que a nossa mente recebe ininterruptamente, o homem é capaz de ouvir... Ouvir a voz de Deus. Imagino que ele deva ter se lembrado das tantas vezes que viu e ouviu coisas ao longo dos mais de mil dias que permaneceu sozinho naquela cidade desde a terrível tragédia. De um modo inexplicável ele sabia que a frase daquela moça fazia muito sentido. Não haviam sido poucas as noites que, dormindo na banheira da casa onde se escondia, ele via imagens tão claras em sua mente que pareciam realmente trazer alguma mensagem. É evidente que eram apenas memórias. Mas por que aquelas memórias? Por que aquelas palavras que ele escutara pouco antes do mundo desabar voltavam sempre e insistentemente à sua mente? Ele não podia negar que o silêncio realmente trazia consigo coisas misteriosas. Mas jamais cogitara ser a voz de Deus. E sua razão tampouco o permitiria tal coisa. Aquilo era ridículo! Como poderia existir Deus diante de tão monstruosa tragédia? Como poderia existir um Deus que ficasse de braços cruzados diante do extermínio de bilhões de vidas, apenas para cumprir o seu divino capricho de não interferir no mundo? De fato não havia sentido naquilo.
“Mas Deus tem um plano”, defendeu delicadamente a moça. Aquelas palavras pareceram ecoar no espírito do homem, mas ele se recusou a refletir sobre elas, se recusou a acreditar; perdeu a fé.
Na última cena do filme, contudo, algo surpreendente acontece. Eles estão encurralados numa sala, a beira da morte. Estranhas criaturas os perseguem. São as pessoas infectadas pelo vírus, que sofreram mutações, e agem como animais raivosos à procura de alimento. Eles são o alimento. Sem qualquer resquício de natureza humana, centenas destas criaturas se acumulam atrás da resistente porta de vidro do laboratório, e tentam ferozmente derrubá-la. É o fim da linha. Eles sabem disso. Mas dentro da sala jaz deitada a última das dezenas de cobaias que ele havia utilizado nos seus experimentos em busca da cura. Algo está diferente com ela. Sua aparência está melhor. Então ele a observa mais atentamente e manifesta a sua surpresa: milagrosamente o vírus está regredindo! No sangue daquela ser amarrado sobre a maca está última esperança para humanidade: a cura! Então a sua euforia se mistura com o seu pavor diante das criaturas subumanas que se debatem raivosamente contra a porta de vidro, que não suportará por muito mais tempo. Seria Deus tão irônico a ponto de permitir que ele morresse precisamente na hora em que havia descoberto a cura?
Então o silencio se faz. Em meio ao desespero mortal que envolve a situação o silencio toma conta da sua mente. O mesmo silencio que por tantas vezes escutou nas longas noites que passara sozinho. Ele não ouve mais as criaturas. Tudo está silencioso. Tudo parece estar em câmera lenta. Ele não tem mais medo. Está seguro de si. Começa a enxergar nitidamente todas as coisas, como se tivesse ajustado o foco de uma máquina fotográfica. Percebe o sofrimento das criaturas por detrás do vidro, percebe o medo de sua amiga Ana encolhida no chão junto à parede. Enxerga os detalhes do seu cabelo, enxerga a tatuagem de borboleta que ela possui atrás da orelha. Então ele ouve. Ouve a última frase dita por sua filha minutos antes dela desaparecer em meio às chamas do helicóptero que explodiu em pleno ar. “Olhe a borboleta papai... Olhe para a borboleta”. Ele não tem mais dúvidas: é a voz de Deus. Pela primeira vez na vida ele sabe exatamente o que fazer. Tão próximo da morte ele consegue perceber o capricho das coincidências. Durante anos ele procurou por um sobrevivente sem nunca o encontrar. Quando o encontra, encontra a cura, e morre. Sim, mesmo sem nenhuma palavra, ele podia escutar a voz de Deus tão claramente que jamais poderia negá-la, jamais poderia desprezá-la, jamais poderia duvidá-la. Retira o sangue da cobaia, coloca Ana juntamente com a cura em um alçapão e hesita diante da última pergunta que a moça faz: “O que você está fazendo?”. A sua resposta é vibrante: “Estou escutando...”. Então ele se explode, levando junto todas as criaturas que acabam por invadir anarquicamente o local. Ana e a cura sobrevivem.
Nunca se vira, talvez, em toda história da humanidade, um silêncio como aquele. Com o extermínio dos habitantes de Nova Yorque aquela cidade, pela primeira vez, ficou em silêncio absoluto. No silêncio o homem ouve coisas. No silêncio absoluto, longe da agitação, longe das infinitas vozes de pessoas, do barulho de carros e buzinas, longe de todos os estímulos que a nossa mente recebe ininterruptamente, o homem é capaz de ouvir... Ouvir a voz de Deus. Imagino que ele deva ter se lembrado das tantas vezes que viu e ouviu coisas ao longo dos mais de mil dias que permaneceu sozinho naquela cidade desde a terrível tragédia. De um modo inexplicável ele sabia que a frase daquela moça fazia muito sentido. Não haviam sido poucas as noites que, dormindo na banheira da casa onde se escondia, ele via imagens tão claras em sua mente que pareciam realmente trazer alguma mensagem. É evidente que eram apenas memórias. Mas por que aquelas memórias? Por que aquelas palavras que ele escutara pouco antes do mundo desabar voltavam sempre e insistentemente à sua mente? Ele não podia negar que o silêncio realmente trazia consigo coisas misteriosas. Mas jamais cogitara ser a voz de Deus. E sua razão tampouco o permitiria tal coisa. Aquilo era ridículo! Como poderia existir Deus diante de tão monstruosa tragédia? Como poderia existir um Deus que ficasse de braços cruzados diante do extermínio de bilhões de vidas, apenas para cumprir o seu divino capricho de não interferir no mundo? De fato não havia sentido naquilo.
“Mas Deus tem um plano”, defendeu delicadamente a moça. Aquelas palavras pareceram ecoar no espírito do homem, mas ele se recusou a refletir sobre elas, se recusou a acreditar; perdeu a fé.
Na última cena do filme, contudo, algo surpreendente acontece. Eles estão encurralados numa sala, a beira da morte. Estranhas criaturas os perseguem. São as pessoas infectadas pelo vírus, que sofreram mutações, e agem como animais raivosos à procura de alimento. Eles são o alimento. Sem qualquer resquício de natureza humana, centenas destas criaturas se acumulam atrás da resistente porta de vidro do laboratório, e tentam ferozmente derrubá-la. É o fim da linha. Eles sabem disso. Mas dentro da sala jaz deitada a última das dezenas de cobaias que ele havia utilizado nos seus experimentos em busca da cura. Algo está diferente com ela. Sua aparência está melhor. Então ele a observa mais atentamente e manifesta a sua surpresa: milagrosamente o vírus está regredindo! No sangue daquela ser amarrado sobre a maca está última esperança para humanidade: a cura! Então a sua euforia se mistura com o seu pavor diante das criaturas subumanas que se debatem raivosamente contra a porta de vidro, que não suportará por muito mais tempo. Seria Deus tão irônico a ponto de permitir que ele morresse precisamente na hora em que havia descoberto a cura?
Então o silencio se faz. Em meio ao desespero mortal que envolve a situação o silencio toma conta da sua mente. O mesmo silencio que por tantas vezes escutou nas longas noites que passara sozinho. Ele não ouve mais as criaturas. Tudo está silencioso. Tudo parece estar em câmera lenta. Ele não tem mais medo. Está seguro de si. Começa a enxergar nitidamente todas as coisas, como se tivesse ajustado o foco de uma máquina fotográfica. Percebe o sofrimento das criaturas por detrás do vidro, percebe o medo de sua amiga Ana encolhida no chão junto à parede. Enxerga os detalhes do seu cabelo, enxerga a tatuagem de borboleta que ela possui atrás da orelha. Então ele ouve. Ouve a última frase dita por sua filha minutos antes dela desaparecer em meio às chamas do helicóptero que explodiu em pleno ar. “Olhe a borboleta papai... Olhe para a borboleta”. Ele não tem mais dúvidas: é a voz de Deus. Pela primeira vez na vida ele sabe exatamente o que fazer. Tão próximo da morte ele consegue perceber o capricho das coincidências. Durante anos ele procurou por um sobrevivente sem nunca o encontrar. Quando o encontra, encontra a cura, e morre. Sim, mesmo sem nenhuma palavra, ele podia escutar a voz de Deus tão claramente que jamais poderia negá-la, jamais poderia desprezá-la, jamais poderia duvidá-la. Retira o sangue da cobaia, coloca Ana juntamente com a cura em um alçapão e hesita diante da última pergunta que a moça faz: “O que você está fazendo?”. A sua resposta é vibrante: “Estou escutando...”. Então ele se explode, levando junto todas as criaturas que acabam por invadir anarquicamente o local. Ana e a cura sobrevivem.